29.3.16

Set my mood



Onde se disserta sobre a razão porque que todas as filhas dos anos 90 e 00 deviam ver a série do O.J. Simpson


Marcia Rachel Clark, a real e a interprete (Sara Paulson)

Mais do que se é culpa do ou não a série American Crime Story - O.J. Simpson devolve-nos um mundo pré 11 de Setembro. Quando se observa toda a investigação do crime em análise o que nos surge na mente é "como é que só fizeram isto? como é que não viram aquilo?". Uns 10 anos a ver programas como CSI (que estrearam pouco mais de 6 anos depois do caso O.J.) fazem do público melhores inquisidores.
No entanto o que marca mais é o modo como Marcia - a procuradora principal - é tratada. De tão espantava até fui ver se assim era mesmo. Ora acontece que Marcia é inicialmente a personagem que tem a faca e o queijo na mão. A verdade parece estar do seu lado. Mas a sua condição de mulher enfraquece-a. Divorciada e mãe de filhos é confrontada desde logo com o tempo que pode dispensar a uma investigação desta envergadura. Quando não consegue estar com as crianças e se vê obrigada a pedir ajuda ao ex-marido é descrita por este como má mãe. A meio do julgamento a sua imagem é criticada ao mais alto nível (espectadores, comentadores, chefes hierárquicos, colegas) sendo a sua opção mudar de imagem. Fotos suas na praia são divulgadas na imprensa. Se grita, em tribunal, é histérica. Se está saturada de todo o processo é depressiva. Neste 20 anos muito mudou. Uma mulher que trabalhasse por si mesma, há 20 anos, era uma guerreira porque todo o mundo puxava no sentido contrário. Vale a pena ver a pobre Marcia a perder um caso "ganho à partida" muito por ser mulher. Mas vale a pena pensar se hoje, à nossa volta, não existem outros tantos casos assim.

28.3.16




BALADA PARA UMA AMIGA VESTIDA DE TERNURA

(...)

...
Amiga, doce amiga,
a tua voz cria as cidades para mim.
As palavras do poema, comovidas,
Percorrem-te os cabelos,
alimentam
o tecer amoroso dos teus gestos.

Amiga, terna amiga,
as tuas mãos abrem em mim os oceanos.
A sombra os antigos sofrimentos
derrotada se esvai
na incrível luz
do teu sorriso de água e liberdade.

Amiga, meiga amiga,
no verde abrigo dos teus olhos eu descanso.
Quantas árvores se erguem, quantos muros
se abatem, quantos rios
desaguam
na confluência dos nossos olhares!

Amiga, querida amiga,
A ternura que me dás viaja-me no sangue.
Sinto que em ti despertam os jardins
onde acontece a vida
e cresce o ritmo
do grato coração com que te canto.


MÁRIO DOMINGOS, in O DESPERTAR DOS VERBOS (Edium Editores, 2011)

25.3.16




O desafio veio na revista Estante (edição da FNAC). Consta em ler (pelo menos) um livro em cada uma das seguintes categorias:

- Um livro de um autor português - Alentejo Prometido (Henrique Raposo)
- Um livro de uma autora portuguesa
- Um livro publicado há mais de 50 anos - A condição humana (Hannah Arendt)
- Um livro escolhido apenas pela capa (dificílimo)
- Um livro escrito sob pseudónimo (nada fácil)
- O primeiro livro de um autor
- Um livro de não ficção - Polio, an american story
- Uma biografia/ autobiografia
- Uma utopia/ distopia
- Uma novela gráfica
- Um livro infanto-juvenil
- Um livro de contos - Granta Portugal nº1 (EU)
- Um livro adaptado ao cinema
- Um livro adaptado à televisão
- Um livro escrito por um sul-americano - Crónica de uma morte anunciada (Garcia Marquez)
- Um livro escrito por um asiático
- Um livro escrito por um africano
- Mais um livro que em 2015 (ou seja...42 livros!)

Até hoje e consultando o meu Goodreads o panorama é o que se vê em cima. Há alguns livros que repetem categorias e outros que se podem inserir em várias mas assim não tem tanta piada. Vou tentar actualizar a lista de três em três meses.

24.3.16




Parece-me que vivi em segurança o melhor período de uma vida humana, a infância.
Nos idos de 80 e 90 a vida parecia promissora. Com um pouco de trabalho podíamos ter uma casa, família, um trabalho.
Por várias razões isso não se verifica. Nem trabalho, nem casa, nem filhos. Até os casais deixam de juntar os trapinhos porque os empregos precários não deixam. As paredes das casas dos pais, que tanto os abrigaram enquanto novos, são hoje as marcas de uma prisão.
A tudo isto junta-se esta névoa. 
A conquista do ar foi um dos pináculos tecnológicos da humanidade. A possibilidade de acordar hoje em Lisboa e adormecer logo à noite em Moscovo era do reino da fábula. Mas o homem conseguiu. Estas viagens - os aviões - marcavam, também, a abertura global do homem. A sensação de pertencer mesmo a um único mundo. Esta sensação estava muito viva em 2000. Depois veio o que se sabe. A seguir a esta semana já só se viaja por necessidade. Pode ter subjacente um prazer (turismo, visitar família distante) mas aquela entrada no aeroporto e aquela travessia de avião são apenas uma etapa ansiosa para alcançar um fim.
Parece derrotista. É apenas real. 

21.3.16

Isto é kitsh mas também é folklore português




Um viva à Leonor Teles (que aliás deu um belo nome à sua obra)

20.3.16




The impact of a single book

Set my mood



Set my mood



Coisas que gostaria de fazer se não... #1


Ainda não vos disse mas como decidi fazer um doutoramento estou pobre como nunca estive (mas rica em conhecimento e saber e blá blá blá). Adiante. Inauguro assim a secção "Coisas que gostaria de fazer se não...".

Aqui fica a primeira entrada.

Iggy no SBSR

Podia ser sincera e dizer que foi por me reverberar ainda na memória o Trainspotting (ainda este ano corri na mesma Princess Street) mas gostava de o ver também por isto




e por isto



Viva quem não se dá por vencido!





Ter trinta é um bocadinho assim:

ONTEM: "Sexta à noite. Tenho que ir para casa ler os 5000 artigos pendentes. Bolas como eu gostava de ficar numa esplanada a beber umas imperiais e comer tremoços com os amigos"
HOJE (artigos em cima da mesa do café quando começam a chegar remessas de miúdos - estudantes de biologia - que rumaram a Coimbra para um encontro universitário):" Que horror! Assim não dá. Falam aos gritos estéticos e nem sabem estar. Vou para casa que não tenho vida para aturar crianças. Preciso de paz e sossego."
Não sei bem se isto é uma crise da idade, de identidade ou de vontade.

"Podemos recordar 1913 de muitas maneiras. Nesse ano, Apollinaire escreveu um ensaio, “Os Pintores Cubistas, Meditações Estéticas”, que logo nos diz em que alvoroço artístico andava a Europa. Freud publicou “Totem e Tabu”. Era um mundo antigo à procura de sensações novas.
Mas havia uma parvónia cheia de sol. O lugar era Hollywood, mundo novíssimo à procura de sensações antigas. Agarraram num velhíssimo material chamado riso e dor, amor e ódio, medo e coragem, reduziram o material a luz e sombras, muito branco, muito negro. Fecharam esse composto em fitas de nitrato, que meteram em latas. Chamaram-lhe “pictures”, chamamos-lhe agora filmes."

Leiam tudo (que vale a pena) aqui!

19.3.16




De todas as vezes em que bati no fundo da existência, para além dos braços amigos que me ampararam as quedas com actos e palavras, sempre foram os livros que me salvaram. Não faço colecções mas recolho as minhas memórias de vida por entre as páginas dos livros que li. É um género de palimpsesto em que as ruas de Madame Bovary se mesclam com o cheiro característico a verão de um olival em Baleizão. As histórias de Philip Roth misturam a crise da poliomielite (Nemésis) e as areias salgadas da Páscoa algarvia. Ler na praia é ler na esplanada! Quando em casa (demasiado andarilha não me encontro lá sempre) passo os dedos pelas lombadas dobradas e remeto-me automaticamente para uma específica amendoeira em flor cita em Trás-os-Montes sob a qual conheci Jorge Luís Borges. Por vezes quero acreditar que há melhor que isto (um sorriso, um cheiro, um olhar) mas nada fica de modo tão permanente gravado em páginas de histórias do que os contos memorizados da nossa própria vida.

Amanhã há feira de antiguidades em Coimbra. Dia de abastecer pois então!



O que se passa no Brasil é de uma sem vergonha miserável. Isto de existirem pessoas sérias é mesmo uma questão de fé. Eu tenho fé que em dado momento do tempo, em certas circunstâncias benévolas, os indivíduos possam ser sérios. Depois passam 15 minutos e já está de volta à nossa própria distorcida natureza. Não perdi a fé nos Homens mas nas pessoas, individualmente, foi-se com o fim da inocência.

Boy meets girl






Despoletada pela música acima que me arrebatou num daqueles dias em que mais valia não sair da cama e seguindo o caminho que o meu estado amorfo me permitia lembrei-me, aleatoriamente, de duetos gaja-gajo que já me haviam salvo dias inteiros.