27.11.12

Da morte


Tenho uma maneira muito própria de lidar com a morte, tal como qualquer um suponho, mas talvez a minha seja mais peculiar porque é a morte e os mortos o âmago da minha área de investigação (a área de trabalho embora intersecte em alguns momentos a de estudo é neste momento distinta). 
De um modo geral investigo  a evolução do Homem mas a partir de material ósseo antigo o que me faz conhecer e investigar também a forma como esses ossos chegaram até mim, o modo como foram enterrados e tratados de maneira a aprender com os mortos como eram os vivos. Na verdade é um estudo biológico e cultural interessantíssimo e que nos dá uma perspectiva sobre os vários aspectos da humanidade. Confere também a quem investiga um certo cinismo em relação à actualidade, é um problema de quem estuda a história do Homem.
Obviamente que para muita gente isto é mórbido e eu tento sempre abordar este assunto com algum tacto aqui no blog mas, sendo este uma extensão de mim, também não poderia passar ao lado dessa parte da minha vida.

Há, também, óbvias consequências para mim quando sou confrontada com a morte de conhecidos, queridos ou a própria (futura) morte. Claro que a falta física das pessoas, a saudade, é sentida de modo igual mas tudo o resto é altamente processado psicologicamente, desde formas de enterramento até ao processo de decomposição, tendo aos 27 anos disposição muito concretas em relação ao meu funeral por exemplo. E acreditem que não sou uma gótica com a mania que só lê Baudelaire.

Dito isto, em jeito de apresentação, é normal que de tempos a tempos, de uma forma ou outra aborde aqui algumas das descobertas (sobretudo a nível da cultura) que faço sobre este funesto tema. Até porque acho que a partir do momento em que entendemos que a morte é o destino final, que é inevitável, conseguimos uma maior leveza no modo como lidamos com a vida.

Hoje trago um link para um livro que achei uma verdadeira pérola. É uma obra de finais do século XIX sobre a História do Luto, deste o Egipto até à época. É importante referir que em plena época vitoriana, época do livro, a morte era tratada de perto e como algo comum, não sendo infrequente que se tirassem fotografias de entre queridos falecidos como única memória destes.


 Foto original da 1915, com uma descendente também chamada Nancy a posar junto à uma campa de uma familiar. Note-se que a pessoa morreu cerca de 100 anos antes da foto ser tirada sendo quase encarada como uma antiguidade.

6 comentários:

  1. Nisso, acho que os Mexicanos, com o seu Dia de los Muertos, ou as fanfarras fúnebres de Nova Orleães têm uma atitude muito mais produtiva em relação à morte. A morte como celebração daquela vida e não como o mar de carpideirices que pauta os povos mediterrânicos.

    On another note: tenho uma visão tão desapegada da (minha) morte e do meu próprio corpo que doei o meu à ciência. Futuros estudantes de anatomia da UP poderão andar para aqui a mexericar à vontade. E até convenci a minha mãe a fazer o mesmo. :)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. São outras culturas que lhes estão na base (também se vê muito em países como o Brasil), sobretudo pré- "descobrimentos europeus" que conseguiram manter uma parte importante da sua matriz por gerações de cristianismo. Até há 2000 anos atrás a Europa tinha uma celebração dos mortos com um carácter muito mais alegre (ao contrário, por exemplo, do Egipto ou de países da antiga Mesopotâmia) restando apenas hoje o dia de finados, mesmo assim, uma comemoração que reúne a família e se festeja nos cemitérios. Por herança judaica, via cristianismo, o império romano, que inicialmente era bastante secular na forma como encarava a morte (herança dos etruscos habitantes anteriores de Roma)tornou-se o maior difusor desta nova abordagem mais carregada da morte. Com a Idade Média e a necessidade de afirmação da Igreja Católica foi o ponto final.

      Em relação a doar o corpo também já me ocorreu até porque aqui em Coimbra, pelo que sei, existe muita falta de doações, mas desisti porque fui informada que o corpo é devolvido para cerimónia fúnebre algum tempo depois, que pode chegar a anos e isso poderia ser muito prejudicial ao processo de luto do meus ente queridos. De qualquer modo acho que é um gesto de louvar.

      Eliminar
    2. É curioso ver como o preceito mais «pesado» do judaísmo (sem a crença no Além e do Céu/Inferno do cristianismo) conseguiu atravessar o cristianismo e o catolocismo em particular até aos dias de hoje, em que é de bom tom vestir de luto e chorar aquando da morte de um ente querido.

      Bom, não sei como se processa em Coimbra, mas no Porto podes ver aqui no link que o cadáver depois é incinerado/inumado depois dos estudos. A minha mãe vive em Lx e também aceitaram a doação dela, por isso, aconselho toda a gente que não veja entraves morais ou afectivos nisso a doar, porque cada vez são menos os materiais de que os estudantes de anatomo-patologia dispõem, o que é uma pena.

      Eliminar
    3. Vou tentar esclarecer melhor como é aqui!

      Eliminar
  2. Eu penso em doar o meu esqueleto para estar pendurado na sala prática! OU então para estar juntamente com os outros no sótão, ao menos não estaria sozinho!

    Os "mountain rats" são no fundo ratos normais. A fotografia é um embuste, foi uma história inventada pelo Sgt. John O'Keefe. Eu já conhecia a imagem de links sobre fotografia nos EUA durante o séc. XIX.
    http://cograilway.com/aboutpikespeak.htm

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Eheh ficavas que era um mimo. Agora estragas-te a foto :P já vou trocar por outra, espero que desta vez, verídica :)

      Eliminar