28.7.12



Já não tenho a minha avó. Morreu mais ou menos há um ano. Sempre soube que ia morrer, estava preparada para o momento em que acontecesse, mas não consegui nunca adivinhar a falta que me iria fazer.

Tal como ela, a casa da minha avó já não existe. Toda a vida foi um rés-do-chão alugado, para os lados do Barreiro, com um grande quintal nas traseiras e um pequeno jardim na frente. Para ela era o lugar perfeito para viver. No jardim tinha roseiras imaculadas que ela tratava com amor e dedicação. De vez em quando aparecia uma rosa numa jarra por cima da  mesa da sala. Nas traseira tinha tudo o que queria e podia tratar, galinhas, patos, a cadela... Mais tarde estes animais foram desaparecendo e deixaram de ser substituídos foi na altura em que ela achou que as horas de sono já não repunham totalmente o desgaste das horas passadas acordada.

A minha avó era a rainha das cores. Por toda a casa imperavam os padrões e as peças kitsh (que para ela eram só bonitas). Quando nasci ela era uma viúva recente e por isso usava o preto. Mas mesmo assim tinha uns padrões psicadélicos nas blusas de que vagamente me recordo. Depois o luto aliviou (e a dor acutilante passou a ser como as dores de reumático, moem (muito), mas permitem viver). Quando morreu a minha avó vestia rosa da cabeça aos pés. Gorro de lã rosa, pantufas rosas, pijama rosa e robe rosa. O nome? O nome também era Rosa.

A avó Rosa gostava de sacos. Não sabia muito bem o que eram malas. Ou mais em consonância com o seu feitio, não gostava de malas logo as malas de viagem não existiam. Existiam os sacos. Mudei de casa há uns meses. Embalei as roupas nas malas de viagem. Mas quando dei por mim tinha o hall da nova casa cheia de sacos de supermercado cheios com as mais diversas coisas. Por estes lados desconhece-se a existência de caixas. Obrigada avó!

A minha avó já não habita este mundo. Existe, numa campa e numa lápide, mas isso não é ela. Ela habita dentro de mim, não só no meu código genético (biologia implacável) mas também na construção social. Cá em casa de vez em quando uma flor faz a sua aparição na jarra que tenho no quarto. Há dias em que esta Lili tem vontade de se deitar por baixo de uma copa verde e de ficar ali a olhar o céu e apreciar verdadeiramente o passar do tempo. Tal como uma Rosa já o fez em meados do século XX, numa terriola do Ribatejo. Há muito da minha avó em mim e isso reconforta-me.

Não mais voltarei à casa (que já não é dela). As rosas murcharam.


Sem comentários:

Enviar um comentário